domingo, 21 de fevereiro de 2010

"Pra te lembrar"

Minha vida, como todas as outras, é feita de um mar irreversível de lembranças. Enquanto algumas pessoas caem pro lado sépio da própria história, ignoro a nostalgia para que eu reveja minhas memórias tais quais filmes favoritos, e dá-se então o milagre: revivo a atmosfera de combinações condicionais que fizeram um momento ser do jeito que foi. Coisa que congelo com cuidado e sem medo, respeitadora das minhas metamorfoses, sem ousar pretender resgatar antigos ares no plano real: o alinhamento dos mundos não se repete, porque as possibilidades são irresistivelmente infinitas. Que fiquem as pessoas, as músicas e os lugares, cada um sendo pleno em sua unidade, contanto que estejamos prontos a saborear todo tipo de mistura, e assim nossos rios correrão tranqüilos.
Pecado mais grave que o da nostalgia é, porém, deixar de visitar – sentimentos-vivos que somos! – alegrias e emoções que bem souberam nos marcar. E por isso escrevo. Por isso deixo rastros pela casa, guardo bilhetinhos de cinema, registro sensações mesmo em carne viva, mergulho no passado cheia de curiosidade de mim. E bastaria uma gota de perfume ou um fio de cabelo pra recuperar nossos filmes-de-vida, nossas histórias em quadrinho, contos de fada e anedotas inacreditáveis, responsáveis por construir dentro de nós uma vibração só nossa e que, se quisermos, podemos doar em abraços. Se assim soubermos fazer, seguiremos deslumbrados e apaixonados pelo que fomos, pelo que somos; pelo intenso mistério do desconhecido, impalpável e – se Deus quiser – eterno.

(Cecília também brinca de colorir verdades, escrevo porque a vida não é o bastante, perdoem se surgirem flores demais)

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