domingo, 21 de fevereiro de 2010

"Pra te lembrar"

Minha vida, como todas as outras, é feita de um mar irreversível de lembranças. Enquanto algumas pessoas caem pro lado sépio da própria história, ignoro a nostalgia para que eu reveja minhas memórias tais quais filmes favoritos, e dá-se então o milagre: revivo a atmosfera de combinações condicionais que fizeram um momento ser do jeito que foi. Coisa que congelo com cuidado e sem medo, respeitadora das minhas metamorfoses, sem ousar pretender resgatar antigos ares no plano real: o alinhamento dos mundos não se repete, porque as possibilidades são irresistivelmente infinitas. Que fiquem as pessoas, as músicas e os lugares, cada um sendo pleno em sua unidade, contanto que estejamos prontos a saborear todo tipo de mistura, e assim nossos rios correrão tranqüilos.
Pecado mais grave que o da nostalgia é, porém, deixar de visitar – sentimentos-vivos que somos! – alegrias e emoções que bem souberam nos marcar. E por isso escrevo. Por isso deixo rastros pela casa, guardo bilhetinhos de cinema, registro sensações mesmo em carne viva, mergulho no passado cheia de curiosidade de mim. E bastaria uma gota de perfume ou um fio de cabelo pra recuperar nossos filmes-de-vida, nossas histórias em quadrinho, contos de fada e anedotas inacreditáveis, responsáveis por construir dentro de nós uma vibração só nossa e que, se quisermos, podemos doar em abraços. Se assim soubermos fazer, seguiremos deslumbrados e apaixonados pelo que fomos, pelo que somos; pelo intenso mistério do desconhecido, impalpável e – se Deus quiser – eterno.

(Cecília também brinca de colorir verdades, escrevo porque a vida não é o bastante, perdoem se surgirem flores demais)

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Aviso aos navegantes

Eu abri a porta, dançando
Seu sorriso rodopiando no ar
(Que, por sinal, era perfumado)
: eu tive vontade de calar
É que, Cecília, se não me escutas
é porque "na tua presença
palavras são brutas"
E é que seus drinks coloridos
Não param de me tomar

(...)

E ainda que fosse noite
Que fosse sábado
Ainda que fosse errado
Ainda que não fosse nada
Tinha gosto de primavera
Trapaceando o calor do verão
E me tocou à flor da terra
Com o feitiço do violão
(Poesia rima com samba?)

E agora, num outro sábado
Já me enriquece outro instante
Porque você já me emudeceu de novo
Já fez a sua parte dançante
Já tem a sua parte em mim
-------e agora parte, distante.
Me partindo sem contar
Se o sorriso era só seu
Ou se tinha nele alguma coisinha
Alguma rima um tanto minha
Que eu possa guardar de você.