segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

O elefante branco, à espera de um prisma

Bom, vamos relembrar o nascimento dos sentimentos: a gente engravida das sensações, as vai alimentando com estrelas, elas tomam feições particulares e passam a ter vida própria – o sentimento. Daí por diante, pouco lhe importa se você não o quer mais, ele vai crescendo, brigando por espaço, fazendo cobranças parasitas, decidindo a hora que sai o Sol.

Portanto, fica claro que a culpa é nossa, e só nossa, por tais maternidades, são nossas as sensações e os sinais que despertam o instinto tão natural ao homem de criar algo seu. Será que, por ser mulher, sou eu mais propensa a engravidar de sentimentos? Oh, diferenças insuperáveis entre o homem e a mulher... Oh, Romantismo egocêntrico, que sempre quer falar do “eu”! Mas falemos de você – através de mim...

E
U tinha 16 anos quando me apaixonei. Não podia beber, fumar, dirigir nem ser presa (mas a lei permite o casamento). Eu engravidei de um poema seu, belo poema, eu toda virgem, empapuçada de palavras.

Existe algo esquizofrênico e muito perigoso nas palavras, que é essa história de criar universos independentes, e muitas vezes, intermináveis. E eu, apaixonada e grafomaníaca, condenei o nosso sentimento à eternidade quando o envernizei de palavras. E você, seduzido por minhas sereias literárias, achou de também me enfeitiçar com as suas (palavras, sereias...), e assim criamos verdades lindas, etéreas e intocáveis. O poder do amor me subiu a cabeça – eu ainda virgem! – desceu para o corpo, te possuiu por dentro, e trancou nossa memória amorosa por todos os lados, pervertendo a alma, santificando o corpo e maltratando o meu coração humano, doido para se sujar na lama, mas que está cego e esquizofrênico, perdido em nosso Éden já abandonado.

Então, por favor, não tente procedimentos cirúrgicos. Vivo gostosamente, viajo mais de uma vez ao ano, me apaixono quando é lua cheia, faço sexo quando tenho vontade: são amores que teço e desteço, teço e desteço, a sina eterna de toda mulher, que é ser Penélope e Pandora. O mal está diagnosticado, hoje falam de gravidez psicológica, mas os sintomas são reais. Olhe bem para o meu amor, (ex) amor! Grande e grandioso, nobre, permanente solstício, todo feito de um vermelho em paz. Já não me acorda de madrugada, nem me pede novas esperanças; é amor bem-comportado, embora nunca vá chegar a ser burguês. Eu já não te acho bonito, você não me faria mulher, não pactuaria com os seus defeitos e vícios e, no entanto, te amo. Peço até desculpas. Não quero pensão.

Entretanto, peço licença. Meu amor, esse elefante, vai passar na sua rua, e vai te incomodar. Entre carros e passados, ele faz graça, dando suas passadas avassaladoras e musicais.